quarta-feira, 29 de julho de 2009

Dói apenas

Há dias horríveis. Em que apetece fugir, desistir, rasgar tudo, zangar-me definitivamente com o mundo. Deus me ajude, que às vezes não sei onde vou buscar as forças. Tenho tanto à minha frente em que trabalhar, produzir, enriquecer-me, mas esta ferida aberta rasga com uma violência que me deixa sem forças, sem energia, sem fé. Quero a minha paz. Só quero a minha paz. Já vai sendo tempo dela.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Sarar

A depressão abate-se sem qualquer aviso. Existem mais que razões para que ela apareça, mas quer-se acreditar que seremos poupados a essa parte. Quem dera puder desligar o interruptor e só acordar daqui a uns tempos, quando estivesse já a iniciar novo tratamento. Mas não, é necessário fazer o luto de cada tentativa falhada. Reviver tudo, uma nova vez. Sentir o medo, a desesperança. Tudo isto implica com o meu dia-a-dia. Falta a motivação, a alegria para o quotidiano. É razoável que assim aconteça. Afinal somos feitos de quê? Ferro? A recuperação é lenta...

Ontem, quando cheguei a casa, vinha de um dia de lágrimas mal contidas. Senti uma tristeza horrível o dia todo. Precisei falar com o meu companheiro. Tenho muita sorte com ele. É profundo, empático, compreensivo. Chorei um pouco, soube-me bem. Compreendo que é mesmo necessário pôr cá para fora, partilhar a dor e a tristeza. Disse-me que também ele estava triste e desiludido. Senti-o na sua voz. Emocionou-se também.

De alguma forma, sinto-me orgulhosa de nós dois. Existe uma enorme compreensão e respeito por aquilo que um e outro passa. Não existe culpa, ressentimento ou dedos apontados. Existe reconhecimento de todo o esforço envolvido, de parte a parte. É impossível um e outro investirem exactamente na mesma medida, nas mesmas coisas. Antes, é uma dança a dois, em que da diferença dos passos se constrói um todo harmonioso.

Mais um dia. Um novo sol. Um pouco mais de alívio. O tempo ajuda ao luto. Pegar em qualquer coisa do nosso quotidiano também. Recomeçar devagar, com respeito pelos "pés torcidos", que não nos deixam correr normalmente. Dar-nos tempo. Inclusive para escrever no blogue!

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Vamos andando

São sustos de angústia. Momentos em que nos lembramos do que está a acontecer. Interrogações profundas de como é que se poderá sobreviver a isto. Depois, instantes de pausa, em que se esquece. Depois volta à lembrança. Compreendo mais hoje quando leio pessoas a dizer que este é um problema que não pode durar para sempre. É horrivelmente desgastante. Toca um dos pontos mais sensíveis da vida e sempre pelo lado negativo, "o que não se tem". Magoa, desgasta, corrompe. Essencialmente desacredita. Desacredita-nos da vida e de qualquer lógica subjacente. É andar, é andar, minha gente. Como se não pudéssemos esperar por nada. Simplesmente andar por cá.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Parar

Ontem fiquei em casa. Precisei de um intervalo, de um espaço para mim. Há que encontrar tempo e espaço para a alma e para o corpo. Cada vez sinto mais que a vida não é feita de correria, e que estas nos trazem muito pouco. Não se pode fingir que se está "óptimo" e que o dia a seguir é um dia igual aos outros, com muita produtividade e energia no trabalho. O tempo que retirei para mim foi muito bom, fez-me sentir melhor. Hoje regressei ao trabalho, com outro alento. Triste, mas de pé, e com capacidade de reagir face ao que tenho que fazer. Olho para trás e sinto que sempre me esforcei tanto. Em todas as dimensões da minha vida, pessoal, familiar, profissional, tudo... Nada vale a pena tanto esforço. Com isto quero eu dizer que investir é necessário, mas com consideração por nós próprios, pelas nossas necessidades de pausa, de descanso. E sobretudo, compreender que, apesar de todo o esforço e investimento, existe uma parte da vida que não se controla, não se domina. Simplesmente acontece, independentemente de qualquer lógica.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Ter com quem

Negativo. Li-o à transparência no boletim das análises, até nem precisava virar a folha. Ficámos sem reacção, quase. Profundamente tristes e desiludidos. Pouco falámos até chegar a casa. Não sei bem descrever o que senti. Quase como se aquela cena não estivesse a acontecer, e tudo se tratasse de um filme. Acho que as minhas emoções já estão muito protegidas e o investimento, a esperança depositada, é menor, é cautelosa. Em casa, sentámo-nos na sala e alí ficámos, a olhar em frente, de mãos dadas, a soltar a fala. Chorei em silêncio, as lágrimas caiam-me devagar. Aliviada, ao mesmo tempo, por saber qual o meu real. Triste, pela ausência do milagre. Mas, devo confessar, que na minha profunda tristeza e desilusão, existia uma enorme serenidade. A ideia de não puder ter filhos faz crescer muito. Obriga-nos a pensar a vida exactamente como ela pode ser; brutal, sem lógica ou justiça. Deliciosa também. Ontem, quando olhava para o meu companheiro, amei-o profundamente. Gosto muito deste homem e de tudo o que trouxe para a minha vida. Neste momento, não a consigo imaginar sem ele. Estamos nisto, os dois, a 100%. O investimento é enorme, de parte a parte. Houve uma altura em que a minha cabeça vagueava, em planos de "salvamento" para mim mesma. Hoje já não quero ser salva de coisa nenhuma. A Bela Adormecida não existe. Existe aquilo que existe. Eu e ele. O nosso amor. O meu talento. O talento dele. A família. Os amigos. A esperança. A capacidade de a perder e voltar a viver.

Vamos voltar a tentar. Temos 2 embriões "congelados" à espera. Já falámos com a nossa médica e a consulta de avaliação ficou para depois das férias. Sem sobressaltos. Fico espantada com a serenidade que sinto. Hoje, sinto-me mais tranquila face à probabilidade de eventualmente ficar sem filhos. A felicidade é de facto um lugar estranho, sem receita certa. E estranhamente, a infertilidade, pelo menos no meu caso, obrigou-me a saber mesmo, mas muito mesmo, o que sinto pelo meu companheiro. Isso dá uma força e uma tranquilidade imensas.

Ontem, adormeci, exausta, ao colo do meu companheiro. É, de facto, uma benção ter com quem partilhar.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Regresso ao "nós"

A minha segunda FIV foi vivida em privacidade, apenas entre mim e o meu companheiro. Inclusivamente cheguei a mentir a uma pessoa, dizendo que não estávamos a tentar. Fiquei, um dia, a pensar porque é que desta vez não tinha tido nenhuma - mas mesmo nenhuma! - necessidade de contar a ninguém. Julgo que por não estar já a viver o trauma. No primeiro ciclo de FIV que fizemos, tínhamos recebido há pouco tempo a notícia do nosso problema, eu estava em estado de choque, incrédula e revoltada com o que me estava a acontecer. Senti muita necessidade de desabafar, de gritar, de sentir a empatia dos outros. Agora isso já passou. Posso voltar ao interior da minha relação e pensar e "fazer" filhos como qualquer casal. Na nossa intimidade e privacidade. Sinto-me muito bem assim. Durante todo o processo, em momento algum, senti a tentação de revelar que estávamos a tentar novamente. Penso, mas isto é muito subjectivo, que uma vivência excessivamente "comunitária" destas questões origina ainda mais stress, uma vez que se tem que contar com as expectativas dos outros, com a sua vontade de apoiar (nem sempre oportuna), com a sua vontade em saber, com a sua desilusão, com o querermos tratar bem os amigos e contar-lhes "atempadamente" o que vai acontecendo. Nem sempre isto acrescenta calma, intimidade, privacidade.

Este blog serve apenas como diário, não tenho nenhuma ideia de o divulgar em massa. Se alguém o encontrar... melhor, mas será um acaso. Divulguei-o a uma mulher com a qual tenho imensa empatia e respeito, e que enfrenta já uma história de infertilidade muito prolongada. Sinto bondade no seu coração e por isso senti vontade de o mostrar.

Os opostos

Amanhã faço o teste de gravidez. Estes últimos dias são tão difíceis...! Só apetece fechar-me em casa, não ter que falar com ninguém, não ter que responder a nada, não ter que me preocupar com nada. Apenas passar o tempo e encontrar-me perante o resultado. Necessito muito do meu real para viver, para assentar e continuar, a partir do que seja. Duvido muito que seja positivo, sinto os sintomas "normais" de quem vai menstruar. O meu companheiro, desta vez, e talvez porque me vê algo incrédula, diz acreditar que é positivo e que a gravidez resultou. Da primeira vez, senti o que estou a sentir agora, contudo, o desejo era tão intenso que racionalizei, pensado que fosse uma adaptação normal do corpo. Desta vez resolvi olhar às coisas como elas são. Se sinto sintomas pré-menstruais, então é isso que tenho que ter em conta e pensar desde já nessa hipótese. Contudo, tenho também sintomas que não recordo de os ter da primeira vez. Contudo, e como é óbvio, não tenho nenhum registo disso, apenas a minha memória das sensações de então.
Este é, sem dúvida, um momento muito difícil. Numa hora acreditamos numa coisa, na outra já o cenário é outro. É um esforço de preparação para apenas dois cenários possíveis e que, em si, nada têm em comum. Um provoca um conjunto de sentimentos, outro provoca outro, totalmente diferentes. Um bem mais difícil que o outro, sem dúvida.
Acredito honestamente que terei a capacidade de enfrentar o pior e o melhor, com a ajuda do meu companheiro.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Dias dificeis

Hoje sinto-me triste. Deprimida até. Todos os sinais no meu corpo apontam que vou menstruar. É difícil continuar a acreditar que a gravidez tenha resultado. Sinto-me muito frustrada e magoada. Custa muito aguentar este embate. Coloca-me em causa, no meu percurso de vida e nas escolhas que eu fui fazendo ou pensando que fui fazendo. Diferentemente da primeira vez, desta vez sinto-me zangada. Como se o destino já estivesse a exagerar. Não é só o bebé. É muita coisa mais na vida, que não tive ou pela qual tive que lutar com forças desmesuradas. Às vezes, sinto que a vida é mesmo um conjunto de banalidades e que ingénua fui eu em pensar que isto teria alguma emoção. Pode ter, mas para muitos seres humanos, não tem. Terei que me resignar e aceitar que sou um desses. Esforcei-me tanto, ao longo do meu percurso. Lutei tanto por mim e pelos outros. Investi tanto em tantas áreas. E parece que nunca saio do sítio. Hoje, sinto-me de facto muito triste, mesmo muito triste. Precisava do meu milagre. E assustador é sentir que cada vez tudo menos me importa. Mesmo o meu milagre.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Paciência

Recebi os resultados das análises à progesterona, estava tudo bem. Contudo, sinto muita "actividade" nos ovários e começo a suspeitar do bom final. Estou mais calma que na primeira vez, lá isso é verdade, mas os últimos dias são mesmo os mais dificeis. Apetece fechar os olhos e encontrar-me na próxima quarta-feira, com o resultado na mão. Tenho mais necessidade do real, do que continuar em qualquer fantasia ou expectativa. Mas o tempo não pode avançar para mim, e não tenho como ter senão paciência. No fim-de-semana vou para fora, é bom para ajudar a aliviar. Depois, são mais dois dias e já posso então fazer a análise. É estranho este momento, que nos pode mudar a vida para sempre. Gostava mesmo que viesse.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Uma semana

Os dias passam. Tranquilos - na medida do possível. Tenho tido alguma "distracção", o que ajuda. Interiormente sinto que esta não é a minha fase. É a vontade dos pequenitos e de Deus, talvez. Não consigo ter nenhuma percepção física do que se passa. Sinto-me um pouco diferente, mas pode ser devido à toma suplementar de progesterona. Sinto-me preparada para o que vier. Apenas na próxima semana saberei o que aconteceu, embora tudo custe, naturalmente. A ansiedade não dói tanto como da última vez. Julgo que reconheço que não controlo a totalidade das coisas, apenas uma parte, e por isso há que aceitar o devir da vida. A ideia que posso ter outras oportunidades para tentar também me ajuda a encarar melhor uma má notícia.
Hoje fiz a análise à progesterona, falta apenas uma semana para ver o fim deste ciclo. Como sou muito regular, da última vez foi a menstruação que me avisou de que o resultado tinha sido negativo, muito embora tenha feito o teste depois. A privacidade com que tudo correu ajudou a não cair do pedestal, de forma mais dura. Agora, vamos a ver. O futuro a Deus pertence.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Descansar em

Deixar fluir, é a mensagem que o universo me manda constantemente. Deixar fluir. Entregar, confiar, descansar em...

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Um dia magnífico

Ontem fiz a transferência de dois embriões top. Foi um dia magnífico por muitas razões. Em primeiro lugar porque soubemos que o resultado da fertilização tinha sido qualitativamente superior à nossa primeira tentativa. Na primeira tentativa de FIV a qualidade dos embriões foi fraca. Assim, nesta segunda tentativa, mudou-se a medicação do ciclo de estimulação, com excelentes resultados. Também, o meu companheiro fez a sua medicação por mais tempo, o que teve bons resultados também. Conseguimos dois embriões top, que foram transferidos e congelamos dois, o que na primeira vez nem sequer tinha sucedido. A forma como o ciclo decorreu foi também, e de forma abismal, totalmente diferente. Os ovários responderam com moderação e passei bem o tempo todo. Fizeram-se algumas alterações que também ajudaram a melhorar a resposta à seguir à punção. O meu corpo ficou "normal", sem todos os problemas nos intestinos, quebras de tensão e hipoglicémia que me acompanhou da primeira vez. A mudança, e sobretudo termos sido actores na mudança, soube muito bem. E depois, tomamos conta do "exterior". Ambiente tranquilo, nada de stress ou pressões, seja de que ordem for, despensa cheia de petiscos (saudáveis, claro!), enfim, um conjunto de circunstâncias que ajudaram a acalmar e a viver cada passo e cada momento com muita tranquilidade.
Ontem, quando me deitei na cama a repousar da transferência, senti uma enorme sensação de felicidade. É possível avançar, melhorar, fazer diferente, ser mais feliz em tudo isto. Desta vez vivi o processo todo com uma energia, paz e mesmo prazer, totalmente diferentes. Recordo o dia da punção. Sentia vontade de a fazer. Pressa em lá estar. Não porque me sentisse mal fisicamente e quissesse acabar com, mas sim porque dentro de mim sentia as diferentes etapas como fazendo parte do mesmo milagre e, por isso, vivê-las era um prazer. O meu companheiro - é um querido! - diz que "sou um espanto, não me queixo de nada". Senti-me, de facto, (devo confessá-lo) muito, mas muito orgulhosa de mim mesma. Também estes são momentos de auto-reconhecimento, das nossas capacidades, da forma como sentimos e olhamos o mundo. Um dia magnífico... sem dúvida.